Inacabamento
Olho coisas
suspensas.
Fui
colocando-as ali, uma a uma, num rito de desapego.
São coisas no
aguardo de completude.
Estão perfiladas
e me olham por tempos lentos.
Há desenhos de
corpos nús em perspectivas confusas.
Foi quando
tentei ser perfeita e deixei tudo torto.
Desenhos
tortos e aleijados.
Falta-lhes a
textura da pele, o pulsar de entranhas e os contornos delgados.
Eles me olham.
As tintas que
escolhi estão embaçadas
Ou misturadas,
ou velhas. Não sei ao certo!
Só sei que não
servem mais.
Quando as
escolhi riram na direção dos meus olhos.
Eram tintas
vivas.
Naquele tempo,
conversávamos em rodas de amigas.
Em
brincadeiras de sermos loucas nos pintávamos a rolar pelo chão da sala.
Agora são
tintas aquietadas e mudas.
Certa vez
abstrai.
Foi quando
pintei um desenho com o amarelo da tinta.
Fiz um céu
amarelo com nuvens de fim de tarde.
Depois. Logo depois
me perdi em contemplação. Não voltei mais.
Agora são
tintas desbotadas de cor. Estão ali, de mãos dadas.
Também me
olham, secas.
Em ganchos
enferrujados há vestidos capengas que se agitam ao sabor dos ventos.
Dançam como
parangolés desengonçados.
Giram, giram
... enlouquecem, giram e param no mesmo lugar.
Rendas, tules,
brocados e fitas se desprendem por costuras rotas.
Em envelopes
lacrados suspendi as palavras.
Impróprias,
inadequadas, de lugar nenhum. Ocas de sentido.
Sinto-as me
ferindo em procura.
Sei da
responsabilidade que tenho com as palavras.
Por isso fico
envergonhada diante delas, ali, enlutadas com os olhos esbugalhados.
São os olhos das
palavras que mais me ferem.
O grito,
também.
Ouço o grito
rouco das palavras.
Todos aguardam
por um gesto de perdão.