Silêncios da semana
As segundas desperta sob fluxos
de memória recente. Espreguiça-se e vive o silêncio dos que vão para o trabalho
arrastando-se sob os laços das gravatas, das agendas e das ressacas. Ao toque dos saltos finos sobre as calçadas,. Segunda é o mais silencioso dos dias,
pois que, traz recordações. Desapega-se com cuidado para não se ferir em coisas que lhe são caras.
As terças o silêncio de promessas
não cumpridas. Do olhar furtivo percorrendo fazes do inacabado. Do jardim para
regar, do voo rasante de pássaros felizes, dos horizontes bêbados. É nas terças
que observa em silêncio a formação das nascentes e a cor das borboletas. É dia
de se nutrir com o sabor do que vive em volta.
As quartas o silêncio dos carros
inabitados com seus vidros escuros circulando em estado nômade. São órfãos
autômatos cruzando-se em irracionalidades. O exasperante e aconchegante barulho
das ruas. O silêncio das mãos que massageiam deixando rastros de maciez na pele
e histórias de histórias de histórias de quem ouve muitas histórias. O silêncio
do almoço solitário entre olhares furtivos de quem não quer se comprometer com
olhares. E segue pela longa quarta-feira de cidade grande para o empório
comprar tomates vermelhos, folhas verdes, mel. Não conversa, apenas acena,
responde, clica senhas em códigos, números, letras.
As quintas o silêncio de mais
promessas. Levantar mais cedo para segurar o sol quando ele estiver nascendo e embalar o
sol pelo resto do dia. Promessa de lavar o carro carregando água no balde e
deixar o carro limpinho, aspirar por dentro e soprar os vidros. Arrumar as
gavetas para retirar roupas que não usa mais. Promete, também, que ao final do
dia vai andar usando tênis e calça marrom. E jura, jura que vai ficar só um
pouquinho deitada no sofá, em frente a TV, vendo algum programa idiota daqueles
que só os desocupados assistem. E cochila em teimosias infantis. Hora de
vadiar. À noite voltará a escrever, promete.
Sexta é dia de silêncios mágicos
carregados em suavidades de incensos, postura zen e a profundidade na busca do
eu. Medita. Depois medita enquanto anda pelo jardim e descobre que os cupins
estão, outra vez, fazendo morada. De olhos fechados inspira, expira, inspira,
expira em visualizações aos toques dos sinos de vento. Abre o livro no capítulo
tal e conversa com a poesia em rimas desencontradas. Embriaga-se de palavras e
decide, entontecida, ser personagem. Deixa-se embalar na brisa silenciosa das
sextas-feiras. Num afã de rebeldia abandona o banco de madeira e vai andar por
aí. Por aí existem vidas que se transformam e é preciso colhê-las agora antes
que o próximo instante as leve em regozijos de extrema liberdade.
O silêncio de sábado e de domingo
tem a sua própria página.