O ENTRE
Entre.
Entre é um lugar ou um tempo.
Coloca-se no depois e no antes. Oscila em beiradas sutis. Tateia confuso, em superfícies que escapam.
São infinitas as suas dimensões.
É lugar e é tempo do meio. De exposição. De nudez.
Constituído de indefinições sofre a condição da falta de sentido, esgueira-se em busca de significados.
Seu martírio de ausências compraz-se em possibilidades.
O Entre é lugar fértil.
Fertilidades que se revolvem num quase vazio...
E a cada movimento de espirais ondulantes se abrem para esse possível.
Nesse lugar, nesse tempo, ou nesse tempo e lugar o ser se admira e admira-se no espanto da dúvida; mira-se em incertezas; inquieta-se.
Luta com o antes no que foi; luta com o depois no que ainda não é. Quer escapar por caminhos seguros.
Ou render-se e, exausto, aquietar-se no aguardo.
O ser desse Entre sequer se reconhece. O que vê na penumbra são fragmentos instáveis.
Não é... Ainda.
O saber que no ainda não é do Entre tudo é possível, enche-o de esperanças.
Nesse espaço de algo que já acabou e que ainda não é outra vez...
Cogita.
Estar nesse Entre é poder alongar-se em pontes que realizam travessias.
É sofrer sem pressa no desconforto excitante de perigo.
Vazios e substâncias se contorcem ali emitindo inaudíveis turbulências. São querências que, confusas, não se sabem querer.
De cima, o Entre borbulha em visões que escapam, que se escondem, resvalam-se.
É um tempo e lugar ilimitado.
Em fertilidade.
Em possibilidades.
quinta-feira, 4 de março de 2010
segunda-feira, 1 de março de 2010
AUTORETRATO
Colocou a própria imagem na tela.
Cada vez que ligava a máquina ali se via e se cumprimentava dizendo alguma coisa do tipo “oi garota...!”.
Reconhecia-se na dificuldade em se reconhecer.
Estranha de si mesma continuava com aquele estranho cumprimento dia após dia.
Às vezes fazia um carinho em si: na foto, ou no corpo ali presente.
Nesse estranhamento deixava-se levar por caminhos igualmente estranhos.
Mas, estava empenhada em se conhecer e por isso embrenhou-se em terapias diversas, ioga, meditação, reclusões e silêncios...
Foram muitas as leituras que sinalizavam um ajudar a si mesmo. Tudo nessa busca do que podia ser. Precisava saber.
Para assim, e só assim poder se amar.
Essa foi a promessa.
Naquele dia olhou a foto mais uma vez e disse olá cheia de simpatia e boa vontade para consigo.
Queria se querer de verdade, rompendo os medos e as amarras do medo. Estava inteira naquela intenção.
Foi na infância e no futuro a um só tempo. Intuiu-se movida por um sentimento de urgência.
E não adiantava os outros quererem-na porque de nada adiantava se ela mesma ainda estava mergulhada na dúvida.
Por vezes se sentia grande demais em um mundo que era apenas uma bola.
Por vezes pequena a esconder-se embaixo das unhas cravadas na palma das mãos.
Os anos de psicanálise diziam: você tem que se amar antes de qualquer coisa.
Você precisa se amar.
E novamente a imagem a lhe sorrir.
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