Falta de espaços vazios, de sonhos não realizados.
Sinto, dolorosamente, a falta que faz uma dose certa
de dor.
Aquela dor da indiferença quando o que queremos,
mesmo que por um só instante, é um olhar apaixonado.
Do telefone que não toca depois daquele encontro
cheio de promessas, que guardamos outra vez, com o zelo de quem tem fé.
Dor de ver, repetidas vezes, a esperança de amor...
morrer.
Isso dói, pra caramba! Dói junto, a dor da culpa.
Isso faz falta.
Sinto falta de um tempo que seja só meu, egoísta e
livre para sentar no bar e ser confundida com uma vadia solitária.
De ver os cochichos e olhares fugidios que se escondem
em disfarces e rituais de pena.
Falta de um tempo para o descuido: sem maquiagem, sem
banho, sem pente nos cabelos. Descalça como uma peregrina.
É isso. Sinto falta do que faz uma solidão.
Sem interrupções para abraços, afetos ou outras
crendices, mergulhar no vazio de uma vida desprovida de ninhos ou camas
quentes.
Desprovida de encontros, de vozes doces, de sorrisos
ou de brindes em taças de cristais.
Nenhum chamado, por engano que seja para responder
em acenos débeis.
Falta de solidão.
A solidão que faz brotar tangos, boleros e
sambas-canção. Tudo em forma de poesia.
E na solidão cultivar silêncios intermináveis,
prenhes de fertilidade.
Contornar com pincéis rotos os corpos que já se
foram em fuga. Banhar em suaves aquarelas almas ausentes.
Ninguém para oferecer água ou café, chegar ou sair.
Dizer sim ou dizer não. Apenas a mesa posta, vazia, espichando-se no abandono
dos que jazem.
Esbanjar-me na sensação das lacunas profundas, de
tempos e espaços expostos somente para os santos e os deuses se compadecerem.
Sinto falta de cantos para me encolher e ser quase
nada. De lá delirar em lamentos a dor de sentir.
Dor que dilacera a vida dos que não aprenderam a
amar.
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