Há algum tempo aceitei o convite de
uma amiga para o lançamento do seu livro inspirado em uma cuidadora de gatos.
Achei uma bobagem, mas comprei dois dos livros. Lá conheci a moça que se
dedicava aos bichanos. Uma simpatia! Não sei se para puxar conversa ou por
curiosidades pueris fiz várias perguntas sobre os tais bichinhos. Entre alguns
preâmbulos disse, sem nenhuma expressão de dúvida, que um dia eu ainda teria um
gato.
Tá bom. Pode ser que sim. Vai saber.
Eu não acredito, mas. Uma coisa te digo: não quero saber de gatos. Soltam
pelos. Fazem xixi. Entrançam-se pelas nossas pernas. Escondem-se em lugares inacessíveis.
Mas o pior mesmo são os pelos. Não quero no meu sofá. E os gemidos estridentes
de criança recém-nascida no meio da noite, o que é aquilo? Nem pode ser uma
coisa de Deus! Exagerei no preconceito. Soube, então, que é só no período do
cio, de dois em dois meses, ou quando estão querendo delimitar território. Se é
de Deus? Claro! São animais poderosos no lidar com a espiritualidade. É por
isso que precisamos dos gatos, para nos proteger. A glândula pineal capta o que
há de pior nos arredores noturnos das casas. Quem consegue ver a aura dessas
criaturas simplesmente se impressiona. Os pretos, os mais rejeitados pelo senso
comum dos medrosos que acreditam em mula sem cabeça, são verdadeiros guardiões.
Sim. Sei nada sobre gatos.
Desconversei. A leitura do livro também não ajudou. Eram crônicas e somente uma
sobre gatos.
Em rodas de amigos ouvi, com pouco
interesse, o relato de experiências com bichinhos de estimação. Verdadeiras
histórias de apego que sempre achei um exagero preferindo ficar com o que guardei
da infância. Lá havia gatos, sempre, e mais. Sem afagos, dengos ou maus tratos
eram deixados por ali esperando comida e atenção. Esgueiravam-se por baixo de
mesas, cadeiras, camas e dormiam em qualquer lugar. Quando atrapalhavam muito a
lida dos adultos eram expulsos com gritos e leves chutes para sair do
caminho. Não lembro de ter brincado com
gatos. Algumas coisas a gente esquece.
Agora esta gata está aqui. Olhei nos
olhos dela quando a examinei a primeira vez para saber se era macho.
Encantei-me com os olhos. Coisa de feitiçaria. Aliás, os olhos dos bichos são
encantadores. Depois vieram as questões práticas. Não sabia comer nem eu sabia
como resolver isso. Nos primeiros dias ofereci leite de caixinha, mas ela
recusou e continuava miando. Pensei em devolver pra rua, mas não tive coragem.
Tentei improvisar seringa e bolinhas pra brincar. Dormia numa caixa na
dispensa. Meu filho encontrou as primeiras soluções em conversas com colegas de
trabalho e assim descobrimos que havia uma ração para gatinhos recém-nascidos.
Depois de duas semanas dei banho para tirar a lama seca e carrapichos que ainda
estavam grudados no pelo dela.
Ok. Fiz a minha parte. Agora estava
pronta para encontrar dona. Primeiro ofereci para as amigas amantes de gatos. A
fulana dorme com seu gato. Deixa-o lamber os pés dela durante a madrugada. Há
de querer essa linda gatinha. Ofereci. Não! Aqui já tem dois e agora a
cadelinha Mel do meu namorado que veio morar comigo. Você não sabia? Não, não
sabia. Então? Mas, vou ajudar a encontrar alguém que queira. Manda fotos.
Mandei. Nada. Tirei mais fotos e postei em redes oferecendo essa gatinha. É
vira-latas, mas é fofa. Uma linda! Por que você não fica com ela? Todas queriam
saber. Por quê? Porque não gosto. Porque não quero. Porque não posso. Viajo
muito! Tentei criar um cachorro... Gosto mais de cachorro, entende? Pois é. Não
consegui. Tive que doar e até hoje estou de coração partido e cheia de culpa.
Acho mais fácil criar gente. Quer ou não quer a gatinha?
Ninguém quis uma gatinha encontrada
na rua.
Leva-se ao veterinário. Vacinas.
Cestinha de viagem. Crescendo e tomando corpo. Castração. Gata, tu vais dormir
na área de serviço. Não quero saber de gata circulando pela casa noite adentro.
E, durante o dia tu vais ficar no quintal. Tem vários bichinhos pra tu caçares.
Li e descobri que os felinos precisam manter o instinto de caçadores. Não
considere que sou sua dona, ainda. Soube de uma loja onde aceitam que se deixe
gato para doação. Estava decidida a ti deixar lá, mas fui ver e não tive coragem.
Dentro das gaiolas com acomodações e alimentos havia uns cinco gatos. Todos com
um olhar triste. Não será dessa vez que vou ti deixar lá.
Nossa conversa ainda não acabou.
Nenhum comentário:
Postar um comentário