quinta-feira, 7 de setembro de 2017

A Gatinha Sophie

Tenho uma gatinha. O nome dela é Sophie Charlotte. Isso mesmo, o nome da bela atriz. Nada intencional. Surgiu. Depois lembrei de quem era aquele nome e deixei. Sinceramente, não gosto de gatos ou gatas prefiro os cães. São mais interativos. Mas, essa bichinha apareceu aqui na rua em frente a minha casa e mais parecia um rato. Movia-se entre restos de construção em tropeços e quedas. Quando percebeu a presença de gente agitou-se mais, sem rumo e um tanto desesperada em ruidosos miados. Percebi logo a dor do abandono. Atravessou a rua e se aproximou das minhas pernas. Desvencilhei-me em demonstrações do tipo não chegue tão perto porque não gosto de gatos e nem estou disposta a cuidar de bichos. Tenho mais o que fazer. Mas a gatinha não desistiu e correu pela íngreme rampa que dá acesso à garagem. Num ato de extrema caridade levei-a com uma das mãos pelas difíceis degraus e deixei na porta lateral da casa. Naquela hora não dava para pensar decisões difíceis porque estava de saída. Voltei meia hora depois. A gatinha estava lá. Miando.

Há algum tempo aceitei o convite de uma amiga para o lançamento do seu livro inspirado em uma cuidadora de gatos. Achei uma bobagem, mas comprei dois dos livros. Lá conheci a moça que se dedicava aos bichanos. Uma simpatia! Não sei se para puxar conversa ou por curiosidades pueris fiz várias perguntas sobre os tais bichinhos. Entre alguns preâmbulos disse, sem nenhuma expressão de dúvida, que um dia eu ainda teria um gato.

Tá bom. Pode ser que sim. Vai saber. Eu não acredito, mas. Uma coisa te digo: não quero saber de gatos. Soltam pelos. Fazem xixi. Entrançam-se pelas nossas pernas. Escondem-se em lugares inacessíveis. Mas o pior mesmo são os pelos. Não quero no meu sofá. E os gemidos estridentes de criança recém-nascida no meio da noite, o que é aquilo? Nem pode ser uma coisa de Deus! Exagerei no preconceito. Soube, então, que é só no período do cio, de dois em dois meses, ou quando estão querendo delimitar território. Se é de Deus? Claro! São animais poderosos no lidar com a espiritualidade. É por isso que precisamos dos gatos, para nos proteger. A glândula pineal capta o que há de pior nos arredores noturnos das casas. Quem consegue ver a aura dessas criaturas simplesmente se impressiona. Os pretos, os mais rejeitados pelo senso comum dos medrosos que acreditam em mula sem cabeça, são verdadeiros guardiões.
Sim. Sei nada sobre gatos. Desconversei. A leitura do livro também não ajudou. Eram crônicas e somente uma sobre gatos.

Em rodas de amigos ouvi, com pouco interesse, o relato de experiências com bichinhos de estimação. Verdadeiras histórias de apego que sempre achei um exagero preferindo ficar com o que guardei da infância. Lá havia gatos, sempre, e mais. Sem afagos, dengos ou maus tratos eram deixados por ali esperando comida e atenção. Esgueiravam-se por baixo de mesas, cadeiras, camas e dormiam em qualquer lugar. Quando atrapalhavam muito a lida dos adultos eram expulsos com gritos e leves chutes para sair do caminho.  Não lembro de ter brincado com gatos. Algumas coisas a gente esquece.

Agora esta gata está aqui. Olhei nos olhos dela quando a examinei a primeira vez para saber se era macho. Encantei-me com os olhos. Coisa de feitiçaria. Aliás, os olhos dos bichos são encantadores. Depois vieram as questões práticas. Não sabia comer nem eu sabia como resolver isso. Nos primeiros dias ofereci leite de caixinha, mas ela recusou e continuava miando. Pensei em devolver pra rua, mas não tive coragem. Tentei improvisar seringa e bolinhas pra brincar. Dormia numa caixa na dispensa. Meu filho encontrou as primeiras soluções em conversas com colegas de trabalho e assim descobrimos que havia uma ração para gatinhos recém-nascidos. Depois de duas semanas dei banho para tirar a lama seca e carrapichos que ainda estavam grudados no pelo dela.

Ok. Fiz a minha parte. Agora estava pronta para encontrar dona. Primeiro ofereci para as amigas amantes de gatos. A fulana dorme com seu gato. Deixa-o lamber os pés dela durante a madrugada. Há de querer essa linda gatinha. Ofereci. Não! Aqui já tem dois e agora a cadelinha Mel do meu namorado que veio morar comigo. Você não sabia? Não, não sabia. Então? Mas, vou ajudar a encontrar alguém que queira. Manda fotos. Mandei. Nada. Tirei mais fotos e postei em redes oferecendo essa gatinha. É vira-latas, mas é fofa. Uma linda! Por que você não fica com ela? Todas queriam saber. Por quê? Porque não gosto. Porque não quero. Porque não posso. Viajo muito! Tentei criar um cachorro... Gosto mais de cachorro, entende? Pois é. Não consegui. Tive que doar e até hoje estou de coração partido e cheia de culpa. Acho mais fácil criar gente. Quer ou não quer a gatinha?

Ninguém quis uma gatinha encontrada na rua.
Leva-se ao veterinário. Vacinas. Cestinha de viagem. Crescendo e tomando corpo. Castração. Gata, tu vais dormir na área de serviço. Não quero saber de gata circulando pela casa noite adentro. E, durante o dia tu vais ficar no quintal. Tem vários bichinhos pra tu caçares. Li e descobri que os felinos precisam manter o instinto de caçadores. Não considere que sou sua dona, ainda. Soube de uma loja onde aceitam que se deixe gato para doação. Estava decidida a ti deixar lá, mas fui ver e não tive coragem. Dentro das gaiolas com acomodações e alimentos havia uns cinco gatos. Todos com um olhar triste. Não será dessa vez que vou ti deixar lá.

Nossa conversa ainda não acabou.

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